16.8.12

O ímpeto ativista e o reverso da piada



Sara Winter, protestando por alguma causa


Sara Winter, 20 anos, representante brasileira do Femen – aquelas manifestantes ucranianas que protestam contra qualquer coisa usando os seios nus – teve parte de seu passado revelado ontem na internet.

Descobriu-se um texto de 2011 em que ela criticava o movimento conhecido por Marcha das Vadias, em que mulheres protestam com trajes sumários contra o machismo e o abuso sexual. Segundo o texto, ela condenava as manifestantes pro não usarem roupas normais. Hoje, Sara usa até menos roupa para protestar.

Num perfil de Facebook, descobriu-se uma velha simpatia por ideais integralistas – o fascismo à brasileira – o que, somado à percepção de que ela tem no peito a tatuagem de uma cruz-de-ferro (célebre condecoração nazista), o que derreteu algo da reputação ativista dela.

Dá uma certa pena. Ela não fez a tatuagem neste ano e afirmou que não tem uma folha corrida de serviços criminais prestados a causas racistas ou fascistas. Aparentemente, pagou o preço de querer muito cedo fazer parte de alguma causa maior no mundo, abraçando símbolos de valores desprezíveis, como a extrema-direita. Em suas explicações, afirma que sua mente mudou.

Anteontem, por exemplo, foi presa de calcinha diante do consulado russo, pedia a libertação das garotas da banda Pussy Riot, que invadiram uma igreja russa e cantaram punk rock contra Putin. Era o protesto da moda no mundo na quarta-feira.

Sara tem um elogiável ímpeto para lutar por qualquer causa. Ao menos, deixou as piores.

                                                                             *

Em 13 de junho de 2007, a então ministra do Turismo Marta Suplicy deixou sua pegada no bestiário nacional ao sugerir um “relaxa e goza” – com sabor a brioches de Maria Antonieta – aos brasileiros que estivessem em longas esperas para embarcar. Elas se tornavam comuns durante a sua gestão.

Cinco anos e dois meses depois, a senadora (PT-SP) de 67 anos relaxou e gozou por quatro horas de pé no Pinto Martins, aeroporto de Fortaleza que também foi afetado pela operação padrão da Polícia Federal que tumultua os terminais do país.

Um caso clássico de piada que se vira contra o próprio humorista.

9.8.12

A chave não abre; quebre-se a porta




O que significa a aprovação de cotas de 50% de vagas das universidades federais para oriundos de escolas públicas? Essa é a pergunta que gostaria de fazer ao leitor, enquanto Dilma não sanciona a proposta.

Na sessão do plenário do Senado, que aprovou esmagadoramente as cotas, o senador Paulo Paim (PT-RS) afirmou que apenas um em cada 10 estudantes do país estuda em escola particular. Ou seja, como argumento para as cotas, temos aí o tremendo fracasso da escola pública do país nas aprovações, o que já é também responsabilidade do partido do ilustre senador.

O que o Senado está nos dizendo é: como o governo não tem condições de proporcionar ensinos fundamental e médio capazes de concorrer com as escolas particulares, a melhor saída para garantir o acesso do aluno estatal à universidade federal é na base do atalho.

Universidades foram concebidas como centros congregantes de inteligência, a fim de produzir mais inteligência. A pesquisa científica, o avanço tecnológico e a interpretação dos rumos da civilização brasileira dependem desse conceito meritocrático de “melhores se reunindo para pensar e contribuir melhor”. Se ela não opera assim é outra história, e aí é o caso de repensar o papel dela, e não o acesso a ela.

Não posso fechar os olhos para o fato de que hoje um diploma universitário é vital para o desempenho de uma carreira, e as federais são uma grife e tanto. Mas o que assusta é que justamente quem mais fala em ir contra as leis do mercado – a chamada “esquerda”, recheada de tantos intelectuais e acadêmicos – prefira fazer justiça social pelo viés mais mercadológico da educação acadêmica: o de que ela tem que preparar – ou melhor, chancelar – para o trabalho.

Impressiona também que essa esquerda, normalmente laica e até antiteísta, aposte tanto num argumento tão assemelhado ao da desprezada “culpa judaico-cristã”: o de que todo oriundo de determinada classe ou cor teria um “pecado original”, que deve ser expiado por meio de gambiarras baseadas em cor e classe.

Paulo Paim ainda afirma que “a rejeição desse projeto significaria não querer que os negros, índios e pardos tenham acesso à universidade”, um argumento tão válido quanto o de um chaveiro ruim que, incapaz de fazer chaves que  abram a fechadura, bota a culpa no “preconceito” da porta e a arromba.

Caso aprovado, o projeto de cotas dá o recado: nas escolas públicas, só somos capazes de ensinar o jeitinho.